Um desses dias publicaram no grupo Formação de Professores em Arte do Facebook a entrevista da arte-educadora Mirian Celeste Martins no Notícias Univesp:


A entrevista girou em torno dos conceitos expostos no livro Mediação cultural para professores andarilhos na cultura (Mirian Celeste Martins & Gisa Picosque, Intermeios, 2010) e me chamou muito a atenção porque me reconheci como uma "andarilha na cultura" e por compartilhar a ideia de que é necessário aproximar as pessoas da arte e da cultura: não basta ver, é preciso saber olhar. 

Acredito que esta leitura é fundamental a todos aqueles que trabalham com o ensino de arte e por isso resolvi divulgá-lo no Cachola Mágica. Para isso entrei em contato com a professora e pesquisadora Mirian Celeste Martins (Instituto de Artes da UNESP / Universidade Presbiteriana Mackenzie) –uma das referências em arte-educação no Brasil, com vários projetos e livros publicados– que gentilmente enviou por email a resenha a seguir, de autoria de Francione Oliveira Carvalho*:

 “São muitas as atuações envolvidas na mediação cultural, porém, sua paisagem conceitual e o fazer da mediação em diferentes situações e lugares é ainda nova e sedenta de pesquisas e reflexões, embora isto venha se transformando nos últimos anos" (MARTINS. PICOSQUE, 2012, p.7). O trecho inicial da obra Mediação cultural para professores andarilhos na cultura, de Mirian Celeste Martins e Gisa Picosque indicam os territórios que serão explorados nos doze capítulos que formam esse livro. As autoras, referência nas discussões sobre o ensino-aprendizagem da Arte e da mediação cultural compartilham inquietações, sensibilidades e provocações que pretendem instigar conversações e diálogos e não estabelecer verdades ou categorizações com fronteiras fixas. É justamente o chamado para o diálogo e a troca que faz da leitura da obra uma experiência mediadora e, parafraseando Deleuze, de afecto, pois para o filósofo francês, os afectos nos obrigam a pensar.

Como tocar o outro para um encontro sensível com a arte? Como tornar significativa uma visita a uma exposição, ou o contato com reproduções ou livros de arte? Como propiciar uma experiência estética integral? Como o mediador pode superar o modelo positivista que pretende fazer pontes discursivas entre duas realidades pré-existentes: a obra e o fruidor? Como criar desafios estéticos para mobilizar fruidores ao encontro com a poética da linguagem da arte? Como o professor pode impedir de ser tomado pelas exigências impessoais do cotidiano da escola que o coisificam e sensibilizar-se para a articulação da complexidade e do processo de mediação?

As questões trazidas pelas autoras agregam discussões presentes nas suas atuações como pesquisadoras e mediadoras culturais, como também, no caso de Mirian Celeste Martins, do exercício acadêmico tanto no Instituto de Artes da Unesp quanto na Pós-Graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie onde coordena o Grupo de Pesquisa em Mediação Cultural: Provocações e contaminações estéticas. Isso revela o caráter agregador e de pesquisa da obra, pois as idéias e posicionamentos tomados ao longo dos textos foram fruto de um exercício colaborativo e investigativo que se estendeu ao longo do tempo, que maturou conceitos e ecoou conversações e encontros. Inclusive, diversas categorias operatórias brotaram desses encontros e ajudaram a estruturar os textos tal como rizoma (Deleuze e Guattari), curadoria educativa (Luiz Guilherme Vergara), aprendizagem inventiva (Virginia Kastrup) e experiência estética (John Dewey). É interessante apontar que esses conceitos não surgem para simplesmente dar nomes a fenômenos ou legitimar teses, mas um arcabouço conceitual que ajuda a ampliar o vivido. Ou em outros momentos, estimular a experiência, tal como os objetos propositores (Lygia Clark) que se tornam provocadores para a criação das idéias de nutrição estética e professor-propositor.

O texto "Objetos propositores: a mediação provocada", resultante das discussões realizadas na disciplina "A mediação Arte/Público" ministrada por Mirian Celeste no Instituto de Artes da Unesp é um dos capítulos mais interessantes da obra por revelar como de discussões teóricas e acadêmicas é possível recriar tanto a teoria como a prática. A partir do trabalho coletivo que visou pensar em possibilidades alternativas para a mediação cultural foram propostos jogos que perpassam diversas experiências e territórios da Arte e da Cultura. Olhando no conjunto, é possível perceber que as propostas revelam tanto interesses pessoais como uma atitude investigativa que oportuniza diferentes encontros estéticos.
As questões trazidas pela contemporaneidade estão presentes nos textos que formam a obra. A arte contemporânea transforma os modos de participação do contemplador, tirando-o do território da contemplação passiva e exigindo que esse novo fruidor convoque todos os seus sentidos para não só comunicar-se com a obra, mas recriá-la. Por isso, torna-se território fértil para a atuação do mediador cultural. Para as autoras, mediar é propiciar espaços de recriação da obra, e essa deve ser vista como a sua própria mediadora. Assim, a mediação cultural precisa ser pensada como uma ação específica que visa dar autonomia e consciência ao olhar.

O mediador é tal como o professor, poeticamente construído pelas autoras, um escavador de sentidos, pois não lida com certezas e com reducionismos simplistas, mas com a compreensão e articulação da complexidade (MARTINS. PICOSQUE, 2012, p. 116). O sentido das coisas nos é dado pela experiência, pela reflexão e pela troca com os outros, e é justamente nesse tripé que a educação e a mediação são cotidianamente construídas. A leitura da obra de Mirian Celeste Martins e Gisa Picosque é uma experiência sensível e ao mesmo tempo provocadora, pois não será provocador afirmar que vivemos uma crise dos nossos sentidos? Que anestesiados pela rotina nos automatizamos e deixamos de compartilhar experiências e afetos? O livro termina com um interessante levantamento de obras, dissertações e teses que discutem as questões da mediação cultural a partir de seus diversos olhares, propondo a continuidade do diálogo. Pelo desejo de novos encontros, pela alma inquieta e pelo fôlego criativo das autoras essa conversa ainda vai longe...

*Francione Oliveira Carvalho - Doutor e Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Membro do Grupo de Mediação Cultural: Contaminações e provocações estéticas do PEHC/Mackenzie. Docente dos cursos de Licenciatura em História e Pedagogia do Centro Universitário Estácio Uniradial.

MARTINS, Mirian Celeste; PICOSQUE, Gisa. Mediação cultural para professores andarilhos na cultura. 2ª Edição. São Paulo: Intermeios, 2012. 162 p. 



Sumário:
1. Caminhando com sandálias de professores andarilhos na cultura
2. Expedições instigantes
3. Mediação: primeiros encontros sensíveis com arte e cultura
4. Revelações do corpo: estesia, conhecimento
5. Coleções: coisas imantadas em nós
6. Sala de aula: experiências para além das visitas/expedições
7. Curadoria educativa: inventando conversas
8. Objetos propositores
9. Professor: escavador de sentidos
10. Travessias para fluxos desejantes do professor-propositor
11. Mediação Cultural: [con]tatos expandidos
12. Um convite à leitura para [con]tatos com mediação cultural





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